Zumbi vive em nós - Dia Nacional da Consciência Negra
Para compreender a historiografia brasileira em relação à presença do negro no Brasil, devemos analisar a trajetória do modo de produção dos povos europeus e africanos. A Europa desenvolvia o processo de transição do feudalismo para o capitalismo. Havia as grandes viagens da Idade Média, o desenvolvimento dos Estados Nacionais, o absolutismo, o mercantilismo, as reformas religiosas protestantes, o Renascimento e o processo de colonização das terras americanas e africanas.
Na África, as relações primitivas estavam alicerçadas na amizade e na ajuda solidária, ou seja no trabalho coletivo. Como as transformações naturais decorrente deste tipo de sociedade, percebe-se que o trabalho coletivo deixa de ser uma necessidade, surge o trabalho individual e as pequenas desigualdades, as lutas entre as tribos que, em guerra arrebanham homens , tornando -os uma espécie de escravos, num caráter doméstico, mais tarde passando a fazer parte daquele grupo étnico e familiar.
Já os europeus, com os complementos do desenvolvimento capitalismo comercial, vão aproveitar a oportunidade, conseguir estes homens de caráter domésticos e escravizá-los realmente, como um instrumento de trabalho, como um animal, que se marca com ferro quente, visando o lucro e vultuosa acumulação de capital. Assim, trazem da África uma mão-de-obra escrava. Os principais grupos étnicos trazidos para o Brasil foram: Os bantos (oriundos de Angola, Golfo da Guiné e Congo), Os sudaneses (predominantes da Costa setentrional do Golfo da Guiné e Sudão) e os males ou háussás (sudaneses islamizados).
Esta mão-de-obra usada em todo o processo do Brasil colonial e do Império , demonstra que na relação senhor e escravizado, os africanos só tinham deveres e nenhum direito. Quando não correspondia às expectativas do senhor, recebia maus tratos que iam da surras(açoites)até a morte. Além disso, sabemos dos abusos sexuais praticados pelos senhores, tanto para os homens, mulheres e até crianças que eram estupradas, curradas. Para satisfazer a bestialidade dos colonos, as mulheres negras eram tidas como mulas sexuais, e daí nasceu a expressão pejorativa de "mulata" referencia feita ao mestiço (branco com negro).
As reações dos negros contra esse processo agressivo de vida vão desde o aborto, suicídio e geralmente fugas para formar os quilombos. Em todo o Brasil, tínhamos este tipo de comunidade, desde a província de Sergipe, São Paulo a região amazonense e Maranhão. A maior importância histórica. Era uma república democrática, onde estabeleciam as eleições, para eleger os chefes dos mocambos(vilas) e por aclamação elegiam o líder que governava com ajuda de um Conselho dos Mocambos e esse chefe maior tinha os seus ministros chamados de fâmulas.
Palmares existiu por 105 anos, chegou a possuir aproximadamente 35 mil habitantes, formados por diversos mocambos como Zumbi de Arutirene, Tabocas, Dambrabanga, Subupira, Osenga, Andalaquituche, Macacos (capital), entre outros.
Zumbi chegou a Palmares em 1670, nesta época o quilombo era governado por Ganga-zumba. Após a sua morte, Zumbi assume o comando de Palmares, um vasto Estado onde haviam várias palmeiras, plantações e uma metalurgia rudimentar, local em que todos gozavam de um plena liberdade e que viviam conjuntamente negros, indígenas e branco.
Em legítima defesa lutaram contra o chamado "mundo do açúcar". Os fazendeiros plantadores de cana, entraram num confronto sangrento contra Palmares. Contrataram Domingos Jorge Velho, um bandeirante paulista caçador de índios e negros para dizimar o Estado afro-brasileiro.
E é em Palmares que vemos o encontro do muçulmano Saifundin com o judeu Ben Suleiman. O capitão Karin Ibn Ali Saifundin chegou esgotado em Palmares mais salvo depois de semanas flutuando numa pequena balsa, mãos solidárias coloca-o para dentro de um barco. E essa história entra na história de Palmares . E aqui Saifundin junta -se a Zumbi, e passa a ser responsável pela construção e a preparação da defesa e resistência de Zumbi, conforme o livro de George Bourdoukan" capitão Mouro".
No período entre 1691 a 1695, dezenas foram os ataques ao Quilombo de Palmares e no dia 20 de novembro de 1695, devido a bandeira de André Furtado que capturou quilombola e prometeu liberdades e vantagens econômicas para a raça, os ex-escravos ajudaram os bandeirantes a acabar com Palmares e assassinar Zumbi dos Palmares, que acabou sendo esquartejado. Ou seja cortaram-lhe a cabeça, seus membros, ridicularizaram o seu corpo e sua figura de herói. E hoje esse dia passa a ser exaltado pela comunidade negra ou afrodescendente como o "Dia nacional da Consciência Negra". Um dia para lembrar da luta por uma sociedade , justa igualitária e fraterna.
Um sonho revisto nas manifestações culturais e debates da comunidade de afro-brasileiros. Com isto temos a destacar o inventário cultural e político, que vai desde a contribuição linguística, as expressões populares, os folguedos, danças, culinárias, religiosidade, que refletem na umbanda no candomblés, na capoeira, congadas, moçambiques, no samba, na feijoada, nos batuques, nos maracatus, nas missangas, no patuá, quitandas, quitudes, fazendo cabeças. socializando esperanças.
E nunca podemos esquecer que enquanto a Inglaterra que foi o país mais desenvolvido do mundo no passado fazia a sua revolução puritana e instalava lá a sua ditadura de Oliver Cromwell, aqui no mesmo tempo respirávamos em Palmares a ideia da democracia e de uma república inclusive com a participação popular. E vale entender que éramos apenas uma colônia de um país absolutista como Portugal, portanto a semente da democracia dos tempos modernos nasceu no Brasil .
E a definição de Consciência Negra, nasce com Steve Biko, redigido provavelmente em dezembro de 1971, num curso de treinamento da SASO, organização sul africano dos estudantes Ubuntu. Steve escreveu o livro "Escrevo o que eu quero", na qual há um manifesto que define o negro como aquele que por lei ou por tradição são discriminados, pela política, economia ou socialmente. ser negro não é uma questão de pigmentação mas de atitude mental, e da necessidade de emancipar-se para acabar com o que entendemos ser uma subserviência.
No Brasil o sonho de todos os afrodescendentes é a necessidade de que os ideiais de Zumbi dos Palmares rebrilhem em todos os corações brasileiros e nos ajudam a recalcitrar diante dos processos de violência, pela qual sofremos e somos reprimidos por esse maldito capitalismo.
Na estrutura da Consolidação das Leis trabalhistas, hoje é feriado um dia de folga ao trabalhador, previsto no Artigo 70 da CLT. E o trabalhador que tiver que trabalhar nesta data é preciso ser remunerado em dobro.
Em relação a legislação sabemos desde 1987 fundamentado na Lei 5680/87, o mês de novembro é considerado o Mês da Consciencia Negra no Estado de São Paulo e no ambito o atual governador Tarcisio de Freitas sancionou a Lei 7968, que criou o Dia Estadual da Consciência Negra, lei que nasceu do projeto de Lei 370/2023 do deputado Teonillo Barba-PT, mesmo sendo feriado nos 645 municípos do Estado de São Paulo.
E hoje é Feriado Nacional, conforme Lei 14759/2023, sancionada pelo Excelentíssimo senhor presidente da República Federativa do Brasil, Sr. Luís Inácio Lula da Silva, no dia 21 de dezembro de 2023, sendo que essa lei nasce do PL da Câmara dos Deputados de n. 3268/2021 aprovada naquela Casa Legislativa por 286 votos a favor e 121 votos contrários, tendo sido a relatora da Proposta a Deputada Reginete Bispo -PT-RS.
O Brasil rende-se em homenagens a essa comunidade de afrodescedentes, que vieram para trabalhar, deram sangue e suor, que construíram sonhos, que integraram-se as outras culturas que vieram depois que compreenderam a cultura dos nativos, que ensinaram o povo a dançar, a cantar e cultuar a vida, o amor, e sonham hoje com um espaço em que podemos fazer sonhar num dia em que brilhe com certeza o anti-racismo, o anti capitalismo, o anti fascismo e que permita a fraternidade a solidariedade a internacionalidade e o Poder Popular. Eticamente.
Manoel Messias Pereira
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